sábado, 13 de junho de 2015
INTERSTELLAR - Greg Keyes (Parte 10)
– IGNIÇÃO! – Disse o controlador de voo.
Por um instante, Cooper pensou que nada iria acontecer, que desde o início tudo tinha sido algum tipo de fraude estranha ou uma ilusão. Mas então sentiu a vibração, o arrepio que percorria a pele de metal da nave - horrível e lenta no início, como uma agitação titânica, mas, em seguida, ganhando velocidade num ritmo terrível.
Então a luz começou a mudar, cada vez mais brilhante, o céu se aproximando com uma enorme mão invisível pressionando-o para baixo, cada vez mais forte.
Gagarin, pensou, Shepard, Grissom, Titov, Glenn, Carpenter, Nikolayev...
O dia brilhante estava desaparecendo quando o horizonte apareceu em sua visão. Houve uma súbita guinada, como se a mão que o pressionasse para baixo desaparecesse por um instante, e seu corpo foi puxado pra frente. Em seguida a força G atirou-o de volta em seu assento.
– Primeiro estágio, separação – ouviu dizer o controle.
Tentou imaginar o enorme foguete impulsionador caindo, mas era difícil pensar em qualquer coisa, empurrado para baixo, com uma bomba controlada às suas costas, lançando-o em direção às estrelas.
White, Chaffee, Komarov...
O horizonte começou a curvar-se. A nave já não estava tremendo, embora ouvia o rumorejar da aceleração. Não conseguia se mover. Sentiu como se pesava mil quilos, como se a próxima vez que exalou fosse a última, e iria sufocar em seu assento de voo.
Então sentiu de repente como se estivesse caindo, quase como se tivesse sido arremessado de um avião e, em seguida, já não pesava nada.
– Segundo estágio, separação – disse o controle.
Armstrong, Collins, Aldrin...
Finalmente, incrivelmente, ele chegara no espaço.
Assim que pode se mover novamente, olhou ao redor da cabine apertada para ver como seus companheiros estavam lidando com a coisa. Dra. Brand, Doyle e Romilly pareciam um pouco como ele - atordoados.
– Todos aqui, Mr. Cooper – disse o quinto membro da tripulação, TARS, o robô que atirara nele à cerca. – Escravos de sobra para minha colônia-robô – completou.
Cooper perguntou se seus ouvidos, ou pior, se seu cérebro tinha sido afetado pela decolagem. Sua confusão devia estar visível em seu rosto, porque Doyle intercedeu.
– Programaram TARS com uma configuração de humor – explicou. – Assim ele se adapta melhor. Eles acham que isso nos relaxa.
– Um robô sarcástico – Cooper observou. – Que excelente ideia...
– Tenho uma luz que posso ligar quando estiver sando de humor, se quiser – TARS ofereceu.
– Provavelmente ajudaria – respondeu Cooper.
– Será útil para encontrar seu caminho de volta a nave, depois que eu ejetá-lo para fora da câmara de ar – disse TARS olhando para ele. Cooper olhou de volta. Não viu nada que parecesse ser uma luz de aviso. Os cabelos na parte de trás do seu pescoço estavam começando a arrepiar-se quando um LED de repente se acendeu.
Franzindo a testa, Cooper balançou a cabeça.
– Para quanto está seu ajuste de humor, TARS? – Perguntou.
– Cem por cento – a máquina respondeu.
Maravilhoso. Quantos meses iriamos aguentar isso?
– Coloque em setenta e cinco, por favor – disse e em seguida, se virou, olhou ao redor para garantir que todo mundo ainda estava seguro em seus assentos, então começou a verificar os instrumentos.
***
Os Rangers siameses entraram em uma órbita baixa, e por um tempo não havia nada a fazer senão esperar. Nada de errado com isso, Cooper refletiu. A cabine oferecia um amplo campo de visão, oferecendo uma vista panorâmica da Terra abaixo deles. Mesmo ainda preso ao assento de voo,
Cooper agia como um turista, observando os continentes, mares e nuvens, pensando que tudo parecia de alguma forma um pouco irreal. O lançamento, a terrível aceleração, parecia agora que ocorrera há muito tempo, quase um sonho.
O planeta - seu planeta - era tão bonito quanto frágil, e era a única casa que a humanidade já conhecera. Vendo-o de fora, achou difícil acreditar que ele não mais os queria lá.
Percebeu que Dra. Brand também estava assistindo o mundo girar abaixo, com uma expressão distante.
– Nós vamos voltar – disse para ela.
Ela não mostrou qualquer sinal de que tinha o ouvido, não afastou sua atenção da visão.
– É difícil – ele continuou. – Deixar tudo. Meus filhos, seu pai...
– Vamos passar muito tempo juntos – Brand disse, voltando seu olhar para ele.
Cooper assentiu. – Devemos aprender a falar um com o outro.
– E quando não o fazer – respondeu ela desviando o olhar de novo. – Só estou tentando ser honesta – acrescentou.
– Talvez não precise ser tão honesta – disse ele. Olhou para o robô. – TARS, qual é o seu ajuste de honestidade?
TARS não precisava de um assento, pois se encaixava em um nicho no centro do painel de controle.
– Noventa por cento – respondeu.
– Noventa? Que tipo de robô é você?
– Absoluta honestidade nem sempre é a forma mais diplomática, ou segura de comunicação com seres emocionais – TARS informou.
É verdade, Cooper pensou ironicamente. Voltou-se para Brand, e encolheu os ombros.
– Noventa por cento de honestidade então.
A princípio, pensou que seria bombardeado de novo, mas, em seguida, os lábios dela traçaram um sorriso no rosto. Quase imperceptível, mas tinha certeza de que estava lá.
Progresso.
– Sessenta segundos... – O rádio estalou.
Cooper decidiu que era melhor parar enquanto estava ganhando. Desviou os olhos para longe da Terra e de Brand, e concentrou sua atenção na Endurance que se aproximava. Sua primeira impressão do satélite em órbita foi de um anel de casamento, brilhando nas luzes gêmeas da Terra e do Sol.
Os Rangers eram elegantes, de asas aerodinâmicas, construídos para pouso e decolagem em planetas que possuíam atmosfera. A Endurance não, não havia nada aerodinâmico nela, seu pouso em qualquer planeta com uma atmosfera seria praticamente o mesmo tipo de pouso que um meteoro faria: rápido, ardente e catastrófico.
Ainda flutuando no espaço, onde havia sido construída, a estação orbital era uma beleza.
Ela era, de fato um anel, mas apenas no sentido mais básico, e conforme eles se aproximavam a impressão desbotava. Pode distinguir que ela era formada a partir de certo número de quadrados, trapezoides, módulos de forma prismática, articulados entre si, por conectores curvos. O ”anel” não estava vazio também. Tubos de acesso a partir da superfície interna do corpo circular levavam a um eixo central, onde ficavam as docas de atracação. Duas naves, módulos de pouso, estavam presos lá. Tudo o que faltava nela eram os Rangers.
Sentindo-se estranhamente calmo, Cooper manobrou combinando a sua velocidade a da nave-estação. Recordava das várias ancoragens em simulações, mas, no fundo de sua mente estava preocupado que a coisa real pudesse jogá-lo em uma espécie de espiral. Conseguiu alinhar com facilidade, e sentiu-se bem com isso.
– É tudo com você, Doyle – disse.
Doyle foi até a escotilha e começou a sequência final, que era a parte mais complicada. Se errasse, no melhor caso perderiam precioso oxigênio e, no pior, bem, ele não tinha certeza, mas poderia ser bem ruim. Viu como Doyle alinhou a matriz circular de pequenas garras para trazer as duas naves juntas até a vedação hermética. Cada garra mecânica fechou-se perfeitamente, como se Doyle tivesse feito isso a vida inteira.
Com isso a Endurance estava completa.
***
Uma vez que o cérebro de primata de Amélia Brand parou de gritar que ela estava caindo e precisava agarrar-se a algo, a gravidade zero acabou por ser uma grande diversão. O menor impulso enviou-a voando sem esforço de uma maneira que nunca tinha imaginado, nem mesmo em seus sonhos.
Era uma pena que tivesse que acabar.
***
Assim que embarcaram na Endurance, ficou claro que não era tão espaçosa quanto parecia do exterior. Parte disso se devia a que dois terços de cada um dos módulos era utilizado para armazenamento. Os pisos, as paredes, quase toda a superfície era composta de escotilhas de vários tamanhos. Em uma embarcação para o espaço profundo, não poderia haver desperdício de espaço, nem mesmo do tamanho de uma caixa de fósforos.
Apertando interruptores e ajustando equipamentos, Amélia, Doyle e Romilly começaram a ligar o que seria a sua casa por, bem, quanto tempo? Observou TARS ativar CASE, uma robô articulado como ele, o último membro da tripulação.
Doyle moveu-se ‘para cima’, para a cabine e ligou o console de comando. Tecnicamente, não havia para cima ou para baixo neste momento, mas em breve deixaria de ser uma tecnicalidade, como a escada que levava do andar inferior ao convés de comando.
Amélia viu quando Doyle terminou de direcionar os sistemas de bordo para os Rangers.
– Cooper, você deve ter controle agora – disse Doyle.
– Parece bom – respondeu Cooper. – Prontos para girar?
Doyle e Romilly se prenderam aos assentos, Amélia seguiu o exemplo. – Tudo pronto – ela respondeu.
Não sentiram nada no início, mas em seguida, o navio começou a tremer quando Cooper disparou os propulsores dos Rangers, angulando perfeitamente para fazer com que a grande roda passasse a girar. Com isso, o peso começou a voltar ao corpo de Amélia, puxando seus pés em direção à borda exterior da nave. Não era gravidade, exatamente, mas a manifestação de inércia, muitas vezes referida como força centrífuga. Sem ela, sem algo que os fizesse pesados, coisas ruins aconteciam com o corpo humano ao longo do tempo, como a perda de massa óssea e doenças cardíacas.
Infelizmente a rotação não era um substituto perfeito para a gravidade, porque o ouvido interno não era inteiramente enganado por ele. O ouvido interno sabia que estavam girando devido a uma coisa chamada o efeito Coriolis. Na Terra o efeito Coriolis era um grande negócio. Ele controlava o clima, criando enormes células de ar em movimento no sentido horário no hemisfério norte, e no sentido anti-horário no sul. Mas a Terra era tão grande que o corpo humano não notava estar girando. No entanto, numa roda gigante de um parque de diversões era fácil sentir isso, muitas vezes com resultados desagradáveis.
A Endurance estava em algum lugar entre esses dois extremos, embora se parecesse mais com a roda gigante.
Amélia sentiu isso por si mesma, especialmente quando chegou ao eixo, mas não pareceu incomodá-la tanto assim. Romilly, por outro lado, já estava um pouco verde.
– Você está bem, não? – Perguntou ela.
– Sim. – Ele praticamente segurava o vômito quando respondeu. – Só preciso de um tempo...
– Deve haver um Dramin no módulo habitacional – ela disse para ele.
Ele balançou a cabeça com gratidão, e tomou cautelosamente aquela direção.
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