sábado, 14 de junho de 2014

A coisa - Alan Dean Foster (Parte 20)

Fazia frio no corredor lateral.
O gerador lutava para repor o calor perdido durante sua parada temporária.
Palmer junto com Childs, metodicamente abria as fechaduras de vedação da sala das plantas. Demorou uma eternidade.
O piloto reserva não gostava de esperar. Preferia muito mais ter ficado na sala de recreação. Mas ordens eram ordens. Pelo menos Mac não tinha o obrigado a ficar com o nervosinho do Sanders.
Por fim, Childs retirou a última tranca e puxou a porta pesada para o lado. Uma inesperada rajada de neve fez os dois homens surpreendidos, darem um passo para trás. Childs firmou seu corpo contra o batente da porta. Palmer apoiou-se perto.
— Meus bebês! — Disse o mecânico ignorando o frio e o vento que entrava ao armazém customizado.
A claraboia ao alto, cuidadosamente lacrada por eles, havia sido esmagada. Havia vidro espalhado pelo chão e ainda ligado às molduras de metal, soldadas à mão.
As plantas estavam mortas. Suas coroas tocavam o chão, incapazes de sustentar o peso do gelo acumulado.
Os olhos de Palmer se arregalaram quando ele pegou na primeira das plantas sob a abertura no teto, uma floresta de pequenas estalactites verdes.
— Algo saiu por ali — balbuciou com medo — ou entrou.
Childs pareceu não ouvir.
— Quem iria fazer uma coisa dessas?
Um ano de cultivo nas horas extras, um trabalho cuidadoso de hidropônica improvisada ​​, tudo perdido.
Deu mais um passo para dentro.
Com o medo fornecendo-lhe a força necessária, Palmer chegou rapidamente e puxou o mecânico de volta.
— Childs, não... não entre!
O homenzarrão se voltou contra ele.
— Me larga homem, antes que eu... — ergueu um punho ameaçador.
— Não, não. — Palmer soltou a camisa de Childs e recuou, suplicando-lhe. — Não entre lá.
Seu olhar foi para o buraco no teto. — Não fique perto das plantas. Elas parecem congeladas, mas não podemos ter certeza. As plantas... essa coisa pode imitar qualquer coisa viva, lembra? Qualquer tipo de construção orgânica.
Childs hesitou,moveu os pés para longe da planta mais próxima.
— O que é que pode fazer como uma planta? Crescer ao redor da minha perna?
— Eu não sei, mas não podemos correr nenhum risco.
 Palmer estava carregando uma das tochas portáteis Verificou a válvula de fluxo e apontou -a para a sala.
— Temos que queimar elas.
— Espere um minuto, seu idiota... — deu um passo na direção do piloto reserva.
Palmer se esquivou e ativou a tocha. Uma trilha estreita de fogo se espalhou além do mecânico.
O gelo foi derretido instantaneamente e as plantas se inflamaram, queimando como finas velas verdes.
A fumaça pungente derivou para o corredor.
Childs empurrou Palmer e começou uma tentativa desesperada de apagar o fogo.
— Seu estúpido filho da mãe, ignorante de merda!
Palmer gritou e ao se virar, caiu deslocando a porta do corredor.
Childs parou de pisoteá-las quando viu o que havia atrás da porta.
O corpo congelado de Fuchs trazia um machado atravessando seu peito, prendendo-o de pé, contra a parede.
Os olhos ainda abertos, junto com a expressão em seu rosto, efetivamente espelhava o espanto frente ao que o havia matado.
Palmer ainda estava gritando.

Norris ouviu o grito e levantou-se de seu assento na sala de recreação. Olhou para o sofá. Todos os três suspeitos ainda estavam fortemente presos e sob o estupor induzido por drogas.
Ainda assim, Macready tinha dado ordens para não sair da sala. Agarrou a buzina de alarme.

Sanders tinha alcançado a sala de armazenamento modificada. Estava fascinado com o cadáver do jovem biólogo, enquanto a sirene continuava a chorar ao seu redor.
Colocou as duas mãos no machado e tentou arrancá-lo sem sucesso.
O lado afiado estava completamente enterrado no peito de Fuchs e na porta atrás.
O operador de rádio desistiu. Recuando, observou o estado desolado de Childs e disse enfaticamente:
— Quem colocou isso nele é um desgraçado malvado, e forte pra cacete!
Childs se aproximou, inspecionando cuidadosamente a terrível visão. Com o punho fechado, bateu no cabo do machado que estremeceu um pouco, mas não afrouxou.
— Ninguém é tão forte assim, rapaz.
— Ouvi a sirene quando voltava — Sanders disse a eles.
— E quanto a Macready e Nauls? — Palmer estava tentando não olhar para o cadáver.
— Acho que estão a caminho. Estavam logo atrás de mim — deu de ombros. — Quien sabe?
Childs assentiu pensativo.
— Tudo bem. Vocês se lembram das ordens. Essa sirene dispara, todo mundo volta para a sala de recreação.
Palmer olhou para fora. — Norris provavelmente me ouviu gritar.
— Sim, e ele não sabe o porquê. Reação sensata. Ei, esqueça isso, cara. Estamos ainda com nossas cabeças. Vamos voltar lá. Podemos fazer algumas verificações no caminho.
Eles fizeram o retorno em bom tempo, abrindo e fechando portas de quartos e corredores enquanto corriam, mesmo aqueles que já haviam inspecionado. Mas, apesar da sensação momentânea de camaradagem que tinham compartilhado de volta da área de armazenamento, Palmer ainda mantinha distância de Childs, Childs mantinha-se longe do piloto e Sanders distante de ambos.
— Eu não entendo — Palmer estava dizendo enquanto corriam — por que não assumiu o controle de Fuchs? Não seria mais lógico... conseguir mais recrutas?
Childs considerava a pergunta enquanto abria a porta de um armário com vários baldes de metal cheios de areia e um grande extintor de incêndio. Isso era tudo. Fechou e foi ver o do lado.
— Acho que não teve tempo bastante. O gerador ficou fora o que, trinta minutos? Vinte? O maldito leva cerca de uma hora ou talvez mais para tomar o controle de alguém, lembra-se? Talvez tenha começado quando as luzes voltaram, ele achou que tinha que escolher entre tentar se esconder e terminar o trabalho. Não iria deixar Fuchs para trás, para contar ao resto de nós que o convidado misterioso era... então eliminou ele.
— Sim, mas por que Fuchs? — Sanders queria saber, enquanto seguiam em frente. — Por que não Macready, ou você, ou eu? As luzes estavam apagadas em todo o acampamento. Poderia ter saltado sobre qualquer um de nós.
— Talvez não estivéssemos acessíveis, ou sozinhos no momento — Childs sugeriu. — Mas eu não apostaria neste motivo.
— Era para Fuchs achar um novo teste, lembra? Ele deve ter esbarrado em algo. Esse desgraçado se assustou e deu conta dele. Talvez nem sequer se preocupou em tentar controlá-lo. Provavelmente estava mais preocupado sobre como se livrar dele.
Parou abruptamente no meio do corredor, virando-se para olhar para a passagem atrás.
— Ei, onde está...? — Olhou para Sanders. — Você não disse que Nauls e Macready estavam logo atrás de você?
Sanders também olhou para trás, o suor destacava-se em sua testa.
— É. Sim, estavam. Acho que os vi pouco antes de começar a descer as escadas. Eu podia ver as luzes deles vindo em minha direção.
— Bem, então, onde estão?
Houve uma pausa e, em seguida, correram pelo corredor gritando os nomes de Mac e Nauls.
Não houve resposta. Continuaram procurando e gritando por vários minutos, até que finalmente chegaram à mesma porta que Sanders. Os gritos cessaram e os três homens trocaram olhares nervosos.
— E agora? — Palmer sussurrou.
Childs estendeu a mão para o trinco, a mão pairando sobre ela, enquanto emoções conflitantes o percorriam. Então falou com firmeza: — A sirene ainda está soando. Vocês conhecem as ordens, temos que voltar para a sala de recreação.
Como voltaram pelo mesmo caminho, continuaram a gritar os nomes dos dois homens que tinham estado fora com Sanders.
A diferença era que agora eles não esperavam uma resposta.



A tempestade retumbou lá fora, seu uivo persistente penetrava até mesmo na hermeticamente fechada sala de recreação.
Os homens entreolharam-se, então para os três cochilando no sofá, para qualquer lugar menos em direção à janela espessa que mostrava apenas escuridão e ocasionalmente, uma enxurrada de partículas de gelo.
Childs marcava o ritmo com o punho batendo regularmente na palma da mão aberta.
— Pare com isso — Palmer finalmente disse a ele. — Você está me deixando nervoso.
O mecânico girou em um salto e caminhou até Norris. — Há quanto tempo eles estão lá fora?
— Não é possível ter certeza — Norris respondeu com cuidado. — Não olhei para o relógio quando eles saíram.
— Dê um palpite. Precisamos saber.
O geofísico pensou e disse:
— Quarenta... quarenta e cinco minutos.
— Tem certeza que não foi mais tempo? Uma hora, talvez?
Norris se contorcia.
— Eu te disse, não prestei muita atenção. Acho que pode ser.
O silêncio era espesso na sala.
Childs começou a andar em direção a porta.
— É melhor começar fechando as escotilhas externas.
— Você tem certeza, Childs? — Perguntou Palmer.
O mecânico parou e olhou através de Norris, que assentiu com a cabeça relutante.
— O que Macready faria, Palmer?
O piloto embora amigo de Mac, disse:
— Sim, você está certo. Vou começar no lado norte, você e Sanders pegam o sul e o leste.
— Você não está esquecendo-se de alguma coisa? — Childs lhe deu um olhar peculiar.
— Eu não... oh, sim. Temos que trabalhar em conjunto. Nesse caso, seria melhor começarmos.
Childs ainda estava olhando para ele.
— Ei, olha, eu esqueci por um minuto, ok?
— Tente não se esquecer de novo, está bem?
Childs começou a sair da sala. Estavam à caminho quando o grito de Norris chegou até eles.
— Todos vocês... venham aqui!
— Merda, o que é agora? — Sanders resmungou e correu atrás de seus dois colegas.
Quando entrou no corredor principal, viu Norris e os outros amontoados contra uma das janelas que ladeavam a porta.
— Ei, o que está acontecendo? — Esforçou-se para ver junto com os outros que bloqueavam a janela.
Palmer apontou para o vidro embaçado.
A figura era pouco visível contra a noite, e vinha cambaleando em direção ao complexo, usando as cordas-guia.



Ocasionalmente, uma rajada particularmente poderosa de vento obrigava-o a parar.
— Quem é? Nauls ou Macready?
— Ainda não dá para dizer com certeza. Mas vamos saber em um minuto.
A silhueta se aproximava, cada vez maior se não mais distinta, até que desapareceu. Em seguida um bater constante soou a partir do outro lado da porta. Childs ergueu o maçarico e deu alguns passos para trás, apontando para Norris.
O geofísico afastou a tranca e puxou a alça.
Uma saraivada de granizo e Nauls entraram como uma única massa congelada.
Norris apressadamente colocar seu peso contra a porta e a fechou, então repôs a trava. Sanders teve que ajudá-lo.
Totalmente sem fôlego, Nauls ajoelhou-se no chão duro, cabeça baixa, as mãos apoiadas sobre os joelhos.
Os homens reunidos em torno dele, observando-o de perto.



— Onde está Macready? — Perguntou Palmer.
O cozinheiro ergueu a cabeça. A expressão sob o derretimento do gelo do rosto, era sombria. Arrancou os óculos de neve e atirou-os para o lado, em seguida, espremeu-se para fora de seu volumoso parka.
— Deixei-o em seu barraco — murmurou ainda atrapalhado com o casaco grosso.
Childs estava boquiaberto. — Deixou-o?
— Tive que fazê-lo! Quando estávamos bisbilhotando seu alojamento, eu encontrei isso.
Puxou um pano grosso de vestuário de dentro de sua jaqueta. Estava rasgado e enegrecido nas bordas, mostrando uma clara evidência de ter sido queimado. Virou para fora o colarinho. Era possível ler claramente o nome na etiqueta:

R.J. Macready.



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