quarta-feira, 16 de julho de 2014

Guerra nas estrelas: Uma Nova Esperança – George Lucas e Alan Dean Foster (Parte 6)



— Olhe, Luke — disse Kenobi, apontando para sudoeste. O carro atravessava a planície arenosa com boa velocidade. — Parece fumaça.

Luke olhou para a direção indicada.

— Não estou vendo nada.

— De qualquer forma, vamos investigar. Pode ser alguém em dificuldades.

Luke mudou de rumo. Pouco depois, também podia divisar ao longe a coluna de fumaça
que Kenobi havia avistado um momento antes.

Chegando ao topo de uma pequena colina, o carro começou a descer a encosta suave que levava a um amplo vale. O vale estava coalhado de formas retorcidas, carbonizadas, algumas inorgânicas, outras não. Bem no meio desta cena de devastação, parecendo uma imensa baleia metálica, estava a carcaça de um veículo dos jawas.

Luke parou o carro. Ele e Kenobi saltaram e começaram a examinar os destroços.
Várias pequenas depressões na areia atraíram a atenção de Luke. Caminhando um pouco mais depressa, aproximou-se e estudou-as por um momento antes de chamar Kenobi.



 — Parece que foram mesmo os tuskens. Aqui estão as pegadas dos banthas... — Luke avistou um objeto meio enterrado na areia. — E aqui está um pedaço daqueles machados de lâmina dupla que eles usam. — Sacudiu a cabeça, confuso. — Mas nunca pensei que os tuskens tivessem coragem de atacar uma fortaleza dessas. — Levantou a cabeça para olhar o gigantesco veículo, agora reduzido a um monte de destroços.

Kenobi estava examinando as pegadas na areia.

— Não foram os tuskens — declarou, em tom casual — mas é o que queriam que pensássemos. Nós e qualquer outra pessoa que passasse por aqui.

— Não compreendo — disse Luke, espantado.

— Examine com atenção estas pegadas — convidou o velho, apontando primeiro para a marca mais próxima e depois para as outras. — Não está vendo nada de estranho? -- Luke sacudiu a cabeça. — Vários banthas passaram por aqui, lado a lado. Mas os tuskens, quando estão montados, andam sempre em fila indiana para que os observadores distantes não saibam quantos são.

Enquanto Luke olhava de boca aberta para os rastos paralelos, Kenobi voltou sua atenção para o enorme veículo. Apontou para os lugares onde os disparos haviam destruído as rodas, as lagartas e as vigas de sustentação.

— Veja a precisão com que os disparos foram feitos. Os tuskens não são tão sutis. Na verdade, nenhum nativo de Tatooine é capaz de destruir com tanta eficiência. — Voltou-se para contemplar o horizonte. Uma das colinas próxima escondia um segredo... e uma ameaça. — Só os soldados do Império seriam capazes de atacar um veículo blindado de forma tão fulminante.

Luke se aproximou de um dos pequenos corpos e o virou de barriga para cima. Fez uma careta de nojo quando viu o que restava da pequena criatura.

— São os mesmos jawas que venderam R2-D2 e C-3PO para Tio Owen. Reconheci a capa deste aqui.

Mas por que os soldados do Império estariam matando jawas e tuskens?
Devem ter matado alguns tuskens para conseguir aqueles banthas.
Seu cérebro estava trabalhando furiosamente e Luke sentiu que todo o corpo se retesava quando olhou de volta para o carro, a alguma distância dos corpos contorcidos dos jawas.

— Mas... se eles descobriram que os andróides foram capturados pelos jawas, também devem saber a quem foram vendidos. E isto os levaria a...— Luke saiu correndo em direção ao carro.

— Luke, espere... espere, Luke! — gritou Kenobi. — É perigoso! — Você não deve...
 


Mas Luke não queria ouvir mais nada. Entrou no carro e apertou o acelerador até o fim.
Com uma explosão de cascalho e areia, deixou Kenobi e os dois robôs parados no meio dos corpos calcinados, tendo por companhia apenas os destroços ainda fumegantes do veículo dos jawas.

A fumaça que Luke avistou ao aproximar-se de sua casa era bem mais espessa do que a da máquina dos jawas. Grossos rolos de fumaça negra saíam de buracos no chão.
Esses buracos haviam sido seu lar, o único lar que jamais havia conhecido.
Agora, assemelhavam-se a bocas de pequenos vulcões.



Luke tentou várias entradas do complexo subterrâneo, e todas às vezes o calor ainda intenso o fez recuar, tossindo.
Já meio cego pela fumaça, entrou cambaleando na rampa que levava à garagem.
Esta também estava cheia de fumaça. Mas talvez os tios tivessem conseguido escapar no outro
carro.

— Tia Beru... Tio Owen!

Era difícil ver alguma coisa em meio à fumaça.
No final da rampa havia dois corpos carbonizados.
Parecia... Luke chegou mais perto, esfregando os olhos irritados.
Não.


 
Então saiu correndo da casa, jogou-se ao chão e enterrou o rosto na areia, como se com isso pudesse dissipar a visão terrível que lhe povoava a mente.





A tela tridimensional ocupava toda uma parede do vasto aposento, desde o chão até o teto. Mostrava um milhão de sistemas planetários. Uma pequena parte da galáxia, mas que não deixava de impressionar quando exibida desta forma.
Abaixo, muito abaixo, estava a imponente figura de Darth Vader, tendo de um lado o Governador Tarkin e do outro o Almirante Motti e o General Tagge, as rivalidades particulares esquecidas diante da importância do momento.



— Os testes finais foram completados — anunciou Motti — Todos os sistemas funcionam
perfeitamente. — Voltou-se para os outros. — Para onde vamos agora?
Vader pareceu não ter ouvido e murmurou baixinho, quase para si mesmo:

— A mocinha tem um autocontrole admirável. Está resistindo bravamente ao interrogador.

— Olhou para Tarkin. — Vamos levar algum tempo para conseguir extrair dela as informações que desejamos.

— Sempre achei seus métodos excessivamente delicados, Vader.

— São eficientes — argumentou o Lorde Negro. — Mas no interesse de acelerar o processo, estou aberto a sugestões.

Tarkin pareceu pensativo.

— Talvez seja a hora de recorrermos a uma ameaça indireta.

— Como assim?

— Penso que é hora de verificarmos de que esta base é capaz. E podemos fazê-lo de uma forma duplamente útil. — Voltou-se para Motti. — Diga aos programadores para planejarem o curso para o sistema de Alderaan.




O orgulho de Kenobi não o impediu de enrolar um lenço velho na boca e no nariz para filtrar uma parte do cheiro pútrido que se desprendia dos cadáveres dos jawas.
Embora dotados de sensores olfativos, R2-D2 e C-3PO não precisavam de proteção. Mesmo C-3PO, que podia reconhecer odores desagradáveis, era capaz de desligar o sentido do olfato quando assim o desejasse.

Trabalhando juntos, os dois andróides ajudaram Kenobi a jogar o último corpo na pira funerária. Então recuaram e ficaram vendo o fogo devorar os mortos. Não que os animais do deserto não fossem capazes de fazer um serviço eficiente, mas Kenobi conservava certos princípios que a maioria dos homens modernos julgaria antiquados. A idéia de deixar alguém à mercê dos comedores de carniça, até mesmo um mísero jawa, o deixava repugnado.

Ouvindo um ruído, Kenobi voltou-se e viu que o carro de Luke estava de volta, viajando desta vez em uma velocidade razoável, muito diferente da forma como havia partido.
O carro reduziu a marcha e parou, mas no interior não havia sinais de vida.
Fazendo um gesto para que os dois robôs o seguissem, Ben correu em direção ao veículo.
A cúpula se abriu e mostrou que Luke estava sentado, imóvel, no assento do piloto.
Não correspondeu ao olhar ansioso de Kenobi. Isto foi suficiente para que o velho adivinhasse o que havia ocorrido.


— Sinto muito, Luke — disse, finalmente. — Não havia nada que você pudesse ter feito. Se estivesse lá, teria morrido, também, e os andróides estariam nas mãos do Império. Nem mesmo a força...

— Para o inferno com sua força! — exclamou Luke, com inesperada violência. Voltou-se para encarar Kenobi. Seu rosto tinha uma expressão mais adulta. — Vou levá-lo ao espaçoporto de Mos Eisley, Ben. Quero ir com você para Alderaan. Aqui não me resta mais nada. — Seus olhos vagaram pelo deserto, fixando-se em algo que ficava muito além das montanhas. — Quero ser um Cavaleiro de Jedi, como meu pai. Quero... — Luke não conseguiu dizer mais nada.

Kenobi entrou no carro, colocou a mau paternalmente no ombro de Luke e inclinou-se para a frente para abrir espaço para os dois robôs.

— Vou fazer o possível para atendê-lo, Luke. Agora, vamos para Mos Eisley.

Luke assentiu e fechou a cúpula. O carro tomou a direção sudeste, deixando para trás os escombros ainda quentes, a pira funerária dos jawas e a única vida que Luke havia conhecido.





Deixando o carro estacionado perto da borda do precipício, Luke e Ben foram até a beirada e olharam para baixo, para as pequenas protuberâncias que semeavam a planície ensolarada.
O conjunto heterogêneo de estruturas de concreto, pedra e plastóide lembrava os raios de uma roda, cujo eixo era a usina de distribuição de água e energia.
Na verdade, a cidade era bem maior do que parecia, já que boa parte era subterrânea.
Parecendo crateras de bombas a esta distância, as pequenas depressões circulares das bases de lançamento se destacavam nitidamente na periferia da cidade.


— Lá está ele — murmurou Kenobi, apontando para o conjunto de edifícios. — O espaçoporto de Mos Eisley. O lugar ideal para nos escondermos enquanto procuramos um meio de deixar o planeta. Não existe uma cidade em Tatooine que abrigue mais vagabundos e aventureiros. Temos que tomar muito cuidado, Luke. O Império já foi alertado a nosso respeito. Mas a população de Mos Eisley será um ótimo disfarce.

Luke tinha uma expressão determinada no rosto.

— Estou preparado para qualquer coisa, Velhi-ban.

Você não sabe o que o espera, Luke, pensou Kenobi. Mas limitou-se a assentir enquanto
caminhava de volta para o carro.

Ao contrário de Anchorhead, onde quase todo o trabalho externo era feito à noite, Mos Eisley era bastante movimentada durante o dia. Construída desde o começo para ser uma cidade comercial, mesmo o mais antigo dos edifícios da cidade oferecia uma boa proteção contra os sóis gêmeos.
Vistos de fora, pareciam primitivos, e muitos eram mesmo. Mas, às vezes, as paredes e arcos de pedra escondiam paredes duplas de aço especial, entre as quais circulava permanentemente um líquido refrigerante.


Luke estava entrando nos subúrbios da cidade quando vários homens armados apareceram subitamente e começaram a formar um círculo em torno do veículo. Por um momento, Luke entrou em pânico e pensou em acelerar loucamente, atropelando aqueles que se colocassem a sua frente. Mas uma mão firme apertou-lhe o braço, acalmando-o e impedindo-o, ao mesmo tempo, de fazer o que pretendia. Olhou para o lado e viu que Kenobi estava sorrindo.

Assim, continuaram a trafegar em velocidade normal, enquanto Luke torcia para que os soldados do Império os deixassem passar. Mas não. Um dos soldados levantou a mão. Luke teve que obedecer. Quando encostou o carro, notou que os passantes observavam a cena com interesse. Pior ainda, parecia que a atenção do soldado não era para ele nem para Kenobi, mas para os dois robôs que estavam sentados imóveis no banco traseiro.

— Há quanto tempo você tem esses andróides? — perguntou o soldado que havia levantado a mão, dispensando todas as formalidades.

Por um momento, Luke não soube o que responder. Então conseguiu balbuciar:

— Três ou quatro anos, não sei ao certo.

 
— Estão à venda, sabe? Uma verdadeira pechincha! — interveio Kenobi, representando com perfeição o papel de um vagabundo do deserto, pronto a tirar alguma vantagem de um soldado crédulo.

O guarda ignorou a observação. Estava ocupado examinando detidamente a parte de baixo do carro.

— Estão vindo do sul? — perguntou.

— Não... não — respondeu Luke, rapidamente. — Estamos vindo do oeste. Moramos perto de Bestine.

— Bestine? — murmurou o soldado, dando a volta para examinar a frente do veículo. Finalmente, concluiu o exame. Aproximou-se de Luke e ordenou: — Deixe-me ver sua identificação.

A essa altura o outro podia ver claramente que estava apavorado, pensou Luke. A recente decisão de enfrentar com coragem o que o futuro lhe reservava se havia desintegrado ante o olhar penetrante do soldado profissional. Sabia o que ia acontecer quando vissem a carteira de identidade, onde estavam claramente estampados o seu endereço e os nomes dos parentes mais próximos.
Alguma coisa começou a zumbir dentro de sua cabeça. Sentiu que ia desmaiar.
Kenobi se havia inclinado para seu lado e estava falando tranquilamente com o soldado.

— Não precisa ver a carteira dele — disse o velho, com uma voz que não era a dele.

Com olhos esgazeados, o soldado declarou, como se fosse uma verdade histórica:

— Não preciso ver sua carteira. — Sua reação era o oposto da de Kenobi: a voz continuava normal, mas a expressão havia mudado totalmente.

— Estes não são os robôs que vocês estão procurando — disse Kenobi, amavelmente.

— Estes não são os robôs que estamos procurando.

— Ele está dispensado.

— Você está dispensado — disse o soldado para Luke.



A expressão de alívio que tomou conta do rosto de Luke era tão reveladora quanto seu nervosismo anterior, mas o soldado do Império a ignorou.

— Vá andando — sussurrou Kenobi.

— Vá andando — ordenou o soldado para Luke.

Indeciso entre fazer continência, acenar com a cabeça e agradecer ao homem, Luke finalmente encontrou forças para apertar o acelerador. O carro se afastou lentamente do grupo de soldados. Antes de dobrar a esquina, Luke arriscou um olhar para trás. O soldado que o havia interrogado parecia estar discutindo com vários companheiros, embora a distância não pudesse ter certeza.
O rapaz olhou para Kenobi e começou a dizer alguma coisa. O velho apenas meneou a cabeça e sorriu. Contendo sua curiosidade, Luke se concentrou na tarefa de dirigir o carro pelas estreitas ruas de Mos Eisley.

Kenobi parecia ter alguma idéia de onde estavam indo. Luke olhou com desagrado para os edifícios decrépitos e para os indivíduos de aspecto suspeito que os cercavam. Haviam entrado na parte mais antiga da cidade, aquela onde os antigos vícios floresciam com maior vigor.
Kenobi fez um gesto e Luke parou o carro na frente do que parecia ser um dos primeiros edifícios da cidade. Havia sido transformado em uma cantina. Os diversos veículos estacionados na entrada davam uma idéia do tipo de clientela. Pela construção do edifício, Luke sabia que boa parte da cantina devia ficar abaixo do solo.

Quando o carro empoeirado mas ainda elegante estacionou em uma vaga, um jawa surgiu do nada e começou a acariciar a lataria do veículo com mãos cobiçosas. Luke inclinou-se para fora e gritou uma ameaça para a criatura, que desapareceu nas sombras.

— Detesto esses jawas — murmurou C-3PO com desdém. — Estou para ver criaturas mais desprezíveis.

Luke estava preocupado demais com os acontecimentos recentes para se importar com os preconceitos do robô.

— Ainda não entendo como conseguimos escapar daqueles soldados. Pensei que estávamos perdidos.

— A força está no cérebro, Luke, e às vezes pode ser usada para influenciar pessoas. É uma arma preciosa. Mas quando conhecê-la melhor, verá que também pode ser perigosa.

Concordando sem realmente compreender, Luke apontou para a cantina, que embora fosse mal instalada, parecia bastante popular.

— Acha mesmo que podemos encontrar aí dentro um piloto capaz de nos levar até Alderaan?

Kenobi estava saltando do carro.

— Alguns dos melhores pilotos de carga são fregueses habituais, embora a maioria pudesse frequentar lugares muito mais dispendiosos. Aqui eles podem falar livremente. A esta altura, Luke, você já devia ter aprendido a não julgar pelas aparências. — Luke olhou para as vestes surradas do outro e se sentiu envergonhado. — Mas tome cuidado. O ambiente, às vezes, é pesado.

Luke teve de apertar os olhos quando entrou na cantina. O ambiente era escuro demais para seu gosto. Talvez os frequentadores habituais não estivessem acostumados à luz do dia, ou não quisessem ser reconhecidos. Não lhe ocorreu que a combinação de uma entrada feericamente iluminada com um interior na penumbra permitia que os que já estavam lá dentro pudessem ver os recém-chegados antes de serem vistos.

Quando os olhos se acostumaram à penumbra, Luke ficou espantado com a variedade dos seres que estavam a sua volta. Havia criaturas de um olho só e de mil olhos, havia seres com escamas, havia bípedes peludos, e havia alguns com uma pele que parecia ondular e mudar de consistência de acordo com as emoções que estavam sentindo no momento.

Perto do bar, um gigantesco inseto, que Luke percebeu apenas como uma sombra ameaçadora, voava lentamente em círculos. Contrastava com duas das mulheres mais altas que Luke já conhecera. Estavam entre as criaturas humanas de aparência mais normal naquele ambiente de pesadelo, em que homens e alienígenas se misturavam e se confundiam.


Tentáculos, garras e mãos seguravam copos de bebida das mais variadas formas e tamanhos.
A conversa era uma mistura inextricável de línguas humanas e alienígenas.
Segurando Luke pelo braço, Kenobi apontou para a extremidade do bar, onde estava sentado um pequeno grupo de humanos mal-encarados, bebendo, rindo e contando piadas.

— Corelianos... piratas, provavelmente.

— Pensei que estávamos procurando um piloto de carga disposto a alugar sua nave — sussurrou Luke.

— E estamos, meu rapaz — concordou Kenobi. — E provavelmente vamos encontrá-lo naquele grupo. Só que os corelianos, às vezes, não dão muita importância aos direitos de propriedade. Espere aqui.

Luke assentiu e Kenobi encaminhou-se para o bar. A atitude hostil dos corelianos se desfez assim que o velho começou a falar.
Alguém segurou Luke pelo ombro e o obrigou a virar-se.

— Ei! — Lutando para recuperar a compostura, Luke descobriu que estava diante de um humano de maus bofes, um verdadeiro gigante. Pela forma como estava vestido, o rapaz deduziu que se tratava de um empregado, se não do próprio dono da cantina.

— Eles não podem ficar aqui — rosnou o brutamontes.

— Quem? — perguntou Luke, surpreso. Ainda não estava recuperado do choque de se ver no meio de uma mistura de dezenas de raças. Era muito diferente do salão de sinuca que ficava atrás da usina de força de Anchorhead.

— Os seus andróides — explicou o empregado com impaciência, apontando com o polegar. Luke olhou na direção indicada e lá estavam R2-D2 e C-3PO, esperando tranquilamente. Vão ter que ficar lá fora. Aqui só servimos criaturas orgânicas. Não temos nada para... para máquinas — concluiu, com uma expressão de nojo.

Luke não gostou da idéia, mas não via outra saída para a situação. O empregado não parecia ser do tipo com quem pudesse argumentar, e quando procurou com os olhos pelo Velho Ben, viu que ele estava conversando animadamente com um dos corelianos.

Enquanto isso, a discussão havia atraído a atenção de vários tipos especialmente malencarados, que olhavam para Luke e os robôs com uma expressão decididamente hostil.

— Está bem, eu não sabia — disse Luke, percebendo que não era a hora nem o lugar de defender os direitos dos andróides. — Desculpe. — Olhou para C-3PO. — É melhor vocês esperarem lá fora, perto do carro. Não queremos criar problemas.

— Estou plenamente de acordo, senhor — disse C-3PO, olhando em torno. — De qualquer maneira, no momento não estou precisando de óleo. — E com R2-D2 em seu encalço, o alto robô encaminhou-se rapidamente para a porta.

O empregado pareceu dar-se por satisfeito, mas Luke se havia tornado o alvo involuntário da atenção dos presentes. De repente ele se sentiu muito só e teve a impressão de que todos os olhos do recinto, humanos ou não, estavam cravados em sua pessoa.
Tentando manter um ar de tranquila confiança, tornou a olhar para o Velho Ben, e teve um sobressalto ao ver com quem o Velho estava falando. O coreliano havia desaparecido. Em seu lugar estava um gigantesco antropóide que mostrava uma boca cheia de dentes quando sorria.

Luke tinha ouvido falar dos wookies, mas nunca imaginara que teria a oportunidade de ver uma dessas criaturas. Embora tivesse um rosto engraçado, que lembrava o de um mico, o wookie podia ser tudo, menos delicado. Apenas os olhos grandes e amarelos destoavam de sua aparência assustadora. O corpo era inteiramente coberto por uma pelagem espessa. Seu traje consistia apenas em um par de cartucheiras cromadas, contendo projéteis de um tipo desconhecido para Luke.


Não, pensou Luke, que alguém tivesse coragem de achar graça na forma como a criatura se vestia. Reparou que os outros fregueses do bar faziam a volta para não passar muito perto do temível antropóide. Todos, exceto o Velho Ben, que estava falando com o wookie na língua deste último, rosnando e grunhindo como se fosse um nativo.

Durante a conversa, o Velho fez um gesto na direção de Luke. O antropóide olhou para o rapaz e soltou uma sonora gargalhada, de arrepiar os cabelos.
Descontente com o papel que estava obviamente representando na conversa, Luke deu-lhes as costas e fingiu ignorá-los. Talvez estivesse sendo injusto com a criatura, mas duvidava de que a gargalhada fosse um gesto de amizade.
Não conseguia imaginar o que Ben poderia querer com o monstro. Não podia entender por que estava perdendo tempo naquela conversa gutural, ao invés de prosseguir as negociações com os corelianos. O jeito foi sentar-se a um canto e sorver o drinque em silêncio, correndo de vez em quando os olhos pela sala à procura de um olhar menos hostil.

De repente, alguém o sacudiu violentamente por trás, com tanta força que Luke quase caiu no chão. Voltou-se, zangado, mas a fúria logo deu lugar a uma expressão de completa surpresa. Estava frente a frente com uma monstruosidade atarracada, de olhos múltiplos e origem indeterminada.

— Negola dewaghi wooldugger? — balbuciou a aparição.

Luke jamais havia visto nada parecido. Não conhecia nem a espécie nem a língua. O que o outro dissera podia ser um desafio para uma briga, um convite para um drinque ou uma proposta de casamento. A despeito de sua ignorância, Luke pôde perceber, pela forma como a criatura cambaleava, que havia bebido demais o que quer que bebesse.
Sem saber o que fazer, Luke limitou-se a concentrar a atenção no copo a sua frente, ignorando deliberadamente a criatura. Nesse instante, uma coisa, um cruzamento de capivara com babuíno, veio chegando e ficou de pé (ou de cócoras) ao lado do olhudo bêbado.
Um homem baixinho, com cara de mau, também se aproximou e abraçou carinhosamente o monstro.

— Ele não gosta de você — disse para Luke, com uma voz surpreendentemente grossa.

— Sinto muito — desculpou-se Luke, desejando ardentemente estar em outro lugar.

— Eu também não gosto de você — prosseguiu o homenzinho, sorrindo.

— Eu disse que sinto muito.

Fosse por causa da conversa que estava tendo com o roedor, fosse por causa do excesso de álcool, a verdade era que o asilo de olhos desamparados estava ficando cada vez mais agitado. Inclinou-se para a frente, quase caindo por cima de Luke, e cuspiu uma torrente de palavras incompreensíveis. Luke percebeu que as atenções gerais voltavam a se concentrar nele.

— Sinto muito — repetiu o homem, em tom de escárnio. Era evidente que também havia passado da conta. — Está querendo insultar-nos? Acho que não sabe com quem está lidando. Nós todos temos a cabeça a prêmio — indicou os companheiros. — Fui condenado à morte em doze planetas.

— Se o ofendi, não foi por querer — murmurou Luke.

— Se pensa que isto vai ficar assim, está enganado — disse o homenzinho, ainda sorrindo.

Neste momento, o roedor soltou um alto grunhido. Imediatamente, todos os espectadores que se haviam reunido para presenciar a discussão recuaram um passo, deixando um espaço livre em volta de Luke e seus antagonistas.
Tentando remediar a situação, Luke ensaiou um sorriso amarelo, que desapareceu no momento em que viu que os três estavam sacando as armas. Além de não ter esperanças de poder lutar contra os três, Luke não tinha a mínima idéia de como eram as armas dos dois alienígenas.


— Vamos, não percam tempo com o nanico — disse alguém, calmamente. Luke olhou para o lado, surpreso. Não havia percebido a aproximação de Kenobi.. — Venham comigo, eu pago um drinque para vocês tr...

Como resposta, o monstro olhudo soltou um guincho ameaçador e desferiu um golpe com um dos seus muitos membros, apanhando Luke totalmente desprevenido.
O rapaz foi atingido na têmpora e arremessado longe, derrubando duas mesas e quebrando uma
garrafa cheia de um líquido malcheiroso. Os espectadores recuaram mais um passo e alguns resmungaram quando o monstro embriagado puxou do cinto uma feia pistola. Começou a acenar com ela na direção de Kenobi. Isto fez entrar em ação o garçom, que até então se mantivera neutro. Abrindo caminho às cotoveladas, colocou-se à frente do trio agitando os braços freneticamente

— Nada de armas, nada de armas! Não aqui dentro!

O roedor mostrou-lhe os dentes, enquanto o monstro olhudo soltava um grunhido de advertência.
No instante em que as atenções do trio se voltaram para o garçom, o velho levou a mão ao disco que trazia na cintura. Um feixe de luz branco-azulada apareceu na penumbra da cantina.
O homem baixinho gritou.
O grito se transformou em um gemido.
Um momento depois, o homem estava caído de costas no chão.
Seu braço direito havia desaparecido.

 

No intervalo de tempo entre o grito do homem e sua queda, o roedor havia sido partido exatamente em dois, as duas metades caindo em direções opostas. O monstro de muitos olhos ainda estava de pé, olhando espantado para o velho, que apontava o sabre de luz em sua direção.
A pistola da criatura disparou uma vez, fazendo um buraco na porta. Então a cabeça se separou do corpo e as duas partes rolaram pelo chão frio da cantina.

Só então foi que Kenobi pareceu soltar um suspiro de alívio. Baixando o sabre de luz, voltou o disco para cima, em uma saudação instintiva que terminou com a arma travada e guardada no cinto.
Este movimento quebrou o silêncio mortal que havia tomado conta do recinto.
A conversa recomeçou, acompanhada pelo arrastar das cadeiras e pelo tilintar dos copos.
O garçom e outros empregados apareceram para arrastar os corpos para fora, enquanto o homem mutilado desaparecia na multidão, considerando-se afortunado por haver escapado com vida.
Tudo havia voltado ao normal na cantina, com uma pequena exceção. Ben Kenobi havia conquistado um respeitoso espaço no bar.

Luke mal percebeu que o silêncio havia sido rompido. Ainda estava atônito com a rapidez da briga e com a agilidade do velho. Quando se acalmou um pouco e aproximou-se de Kenobi, pôde ouvir pedaços de conversas. Todos estavam comentando que a vitória do velho havia sido justa.

— Você está machucado, Luke — observou Kenobi, solicitamente.

Luke levou a mão ao local onde tinha sido atingido pelo monstro.

— Acho que não foi... — começou a dizer, mas o Velho Ben o interrompeu. Como se nada tivesse acontecido, apontou para a massa cabeluda que se aproximava.

— Este é Chewbacca — explicou para o rapaz, quando o antropóide se reuniu a eles no bar. — Trabalha como imediato em uma nave que talvez nos sirva. Agora, vai-nos apresentar ao capitão e dono do cargueiro.

— Por aqui — grunhiu o wookie, ou coisa parecida. De qualquer forma, o gesto de "sigam-me" da criatura era inconfundível. Encaminharam-se para os fundos da cantina, o wookie abrindo caminho na multidão como uma faca cortando manteiga.

Em frente à cantina, C-3PO passeava nervosamente de um lado para outro. R2-D2 estava entretido em uma animada conversa eletrônica com um R-2 vermelho vivo, pertencente a outro freguês da cantina.

— Por que estão demorando tanto? Disseram que iam alugar uma nave, não uma frota.

De repente, C-3PO parou e silenciou R2-D2 com um gesto. Dois soldados do Império haviam chegado à porta da cantina. Foram recebidos por um homem mal vestido, que havia surgido quase que simultaneamente de dentro da cantina.

— Não estou gostando nada disso — murmurou o andróide.

Enquanto se encaminhavam para o fundo da cantina, Luke havia apanhado o drinque de alguém na bandeja de um garçom que passava. Engoliu a bebida com o ar negligente de quem se encontra sob a proteção divina. Não era bem assim, mas em companhia de Kenobi e do gigantesco wookie, o rapaz tinha certeza de que ninguém na cantina se atreveria a incomodá-lo de novo.

Em um reservado dos fundos estava um homem de feições angulosas que podia ser cinco anos mais velho do que Luke, como podia ser dez, era difícil dizer. Tinha o ar despreocupado de uma pessoa extremamente confiante, ou totalmente irresponsável. Quando viu que tinha visitas, mandou embora a prostituta humanóide que se remexia em seu colo, cochichando-lhe no ouvido alguma coisa que a fez sorrir.

Chewbacca rosnou alguma coisa para o homem e ele fez que sim com a cabeça, sorrindo amistosamente para os recém-chegados.

— Você sabe usar muito bem aquele sabre, velho. A gente quase não vê mais uma exibição dessas nesta parte do Império. — Bebeu metade do líquido que estava no copo de um gole só. —Meu nome é Han Solo. Sou capitão do Millennium Falcon. A voz assumiu de repente um tom impessoal. — Chewie me disse que estão querendo viajar para o sistema de Alderaan.


 — Isso mesmo, filho. Mas precisamos de uma nave veloz — disse Kenobi.

Solo não pareceu incomodar-se com o "filho".

— Veloz? Então você nunca ouviu falar do Millennium Falcon?


Kenobi achou graça.

— Devia?

— É o cargueiro que fazia a rota de Kessel em menos de doze unidades galácticas! — exclamou Solo, indignado. — Já ganhei de naves estelares do Império e de cruzadores corelianos. Agora acha que é suficientemente veloz? — A explosão passou rapidamente. — Qual é a sua carga?

— Passageiros, apenas. Eu, o rapaz e dois andróides... e nada de perguntas.

— Nada de perguntas. — Solo olhou pensativamente para o copo, depois levantou a cabeça. — Problemas locais?

— Digamos que não nos queremos envolver com os soldados do Império — respondeu Kenobi, sem pestanejar.

— O que não é nada fácil, nos dias de hoje. Vai custar um pouquinho mais. — Fez alguns cálculos de cabeça. — O serviço todo vai ficar em dez mil. Adiantados. E nada de perguntas — acrescentou, com um sorriso.

Luke estava de boca aberta.

— Dez mil! Mas isso dava para comprar um cargueiro!

 
Solo deu de ombros.

— Pode ser que sim, pode ser que não. Mas quem iria pilotá-lo?

— Eu mesmo — respondeu Luke, levantando-se. — Tenho certa experiência, sabe? Eu não...

Kenobi apertou-lhe o braço com força.



— Não temos tanto dinheiro conosco — explicou para o capitão. — Mas podemos pagar dois mil agora e mais quinze mil quando chegarmos a Alderaan.

Solo cocou o queixo, indeciso.

— Quinze mil... você pode realmente arranjar tanto dinheiro?

— Palavra de honra... e será do próprio governo de Alderaan. Na pior das hipóteses, você terá uma recompensa justa pelo seu trabalho: dois mil.

Solo pareceu não ouvir a última frase.

— Dezessete mil... está bem, vou correr o risco. Negócio fechado. Mas se não querem envolver-se com os soldados do Império, é melhor darem o fora já... — Apontou para a entrada da cantina, e acrescentou rapidamente: — Plataforma de lançamento noventa e quatro, ao amanhecer.

Quatro soldados do Império haviam entrado na cantina e estavam olhando em todas as direções. Alguns fregueses começaram a resmungar, mas cada vez que um dos soldados olhava na direção de onde partira o protesto, o responsável imediatamente se calava.

Encaminhando-se para o bar, o chefe dos soldados fez algumas perguntas rápidas para o empregado. O homem hesitou por um momento e depois apontou para um reservado nos fundos da cantina.

 
Ao fazê-lo, seus olhos se arregalaram ligeiramente.
O soldado não mudou de expressão.
O reservado indicado estava vazio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Diga...