domingo, 10 de janeiro de 2016

Don't Look Now - Daphne du Maurier (Parte 1)





 — Não olhe agora – disse John para sua esposa – mas tem um casal de velhinhas a duas mesas de nós, tentando hipnotizar-me.



Laura, rápida, fez um elaborado bocejo, então inclinou a cabeça como se procurasse no céu por um avião.

— Logo atrás de você — ele acrescentou. — É por isso que você não pode virar-se, seria óbvio demais.

Laura, usando do truque mais antigo do mundo deixou cair o guardanapo, em seguida, inclinou-se para ele debaixo dos seus pés, enviando um olhar sobre seu ombro esquerdo enquanto se endireitava. Baixou a cabeça.





— Não são velhinhas — disse ela disfarçando. — São gêmeos travestis.

Sua voz tornou-se ameaçadora, o prelúdio para um riso descontrolado, e John rapidamente derramou o chianti em seu copo.

— Finja que engasgou, ou elas vão notar. Você sabe o que são de verdade? Criminosos percorrendo os pontos turísticos da Europa, transando em cada parada. Irmãs gêmeas aqui em Torcello. Irmãos gémeos amanhã em Veneza, ou mesmo hoje à noite, desfilando de braços dados pela Piazza San Marco. Apenas mudando de roupas e perucas.

— Ladrões de jóias ou assassinos? — Perguntou Laura.

— Oh, assassinos sem dúvida. Mas por que me escolheram?


O garçom interviu trazendo café, o que deu tempo de Laura para recuperar o controle.

— Não sei como não notamos quando chegamos.

— Foi aquele bando de americanos ali — disse John — e aquele homem de barba com um monóculo que se parece com um espião. Distração pura. Só então vi as gêmeas. Oh Deus, aquela com o cabelo branco está de olho em mim de novo.

Laura tirou o estojo de pó compacto de sua bolsa e segurou na frente de seu rosto, utilizando o espelho.

— Acho que sou eu quem estão olhando, não você — disse ela. Graças a Deus deixei minhas pérolas com o gerente do hotel. — Fez uma pausa, empoando os lados do nariz com pó. –É o seguinte — disse ela depois de um instante — estamos errados. Não são assassinos, nem ladrões. É um casal de velhas e patéticas professoras aposentadas em férias, que economizaram trocados por uma vida inteira para poder visitar Veneza. Elas vêm de algum lugar com um nome como Walabanga na Austrália. E se chamam Tilly e Tiny.


Pela primeira vez desde que tinham chegado, sua voz assumira a antiga qualidade borbulhante que ele tanto amava, a expressão preocupada de suas sobrancelhas tinha desaparecido. Finalmente, pensou, ela está começando a superar. Se eu puder continuar assim, a velha rotina familiar de piadas compartilhadas nas férias e em casa, as fantasias ridículas sobre as pessoas em outras mesas, ou hóspedes no hotel, ou vagando em galerias de arte e igrejas, então tudo vai voltar ao lugar, a vida se tornará como era antes, a ferida vai cicatrizar, ela vai esquecer.

— Sabe — disse Laura — foi um almoço muito bom. Gostei muito.

Graças a Deus, pensou ele, graças a Deus... Então se inclinou para frente, falando baixo em um sussurro conspirador: — Um deles está indo ao banheiro. Você acha que ele, ou ela, vai trocar de peruca?

— Não diga nada — murmurou Laura. — Vou segui-la e descobrir. Ela pode ter uma mala escondida lá, e mudar de roupa.

Ela começou a cantarolar baixinho, um sinal para ele de contentamento. O fantasma da crise temporariamente desaparecera, e tudo por causa de um joguinho em férias familiares, abandonado por muito tempo, e agora, através de mero acaso, felizmente recapturado.

— Ela está a caminho? — Perguntou Laura.

— Prestes a passar pela nossa mesa agora.

A mulher em si não era tão notável. Alta, angulosa, características aquilinas, com o cabelo cortado rente que era elegantemente chamado de estilo Eton, o fez lembrar-se de sua mãe, ou algo da geração dela. Estaria na casa dos sessenta e pouco, supôs, paletó esporte, saia de tweed chegando ao meio da perna. Meias cinza e sapatos de amarrar. O tipo visto em campos de golfe e em exposições caninas, invariavelmente ostentando, não cães de raça, mas pugs.

— Suponha que, murmurou Laura, quando eu estiver no toalete ao lado, ela comece a se despir?

— Depende do que será revelado — John respondeu. — Se ela for uma hermafrodita, tente sair logo de lá. Ela pode ter uma seringa hipodérmica escondida e querer acertá-la antes de chegar à porta.
Laura fez um barulho com a boca e fingiu tremer. Então, endireitando os ombros, se levantou.

— Eu não posso rir agora — disse ela — e aconteça o que acontecer, não olhe para mim quando eu voltar, especialmente se saimos juntos de lá.

Pegou sua bolsa e caminhou conscientemente para longe da mesa em busca de sua presa.


  John derramou a borra do chianti no seu copo e acendeu um cigarro. O sol ardia sobre o pequeno jardim do restaurante. Os americanos tinham ido embora assim como o homem de monóculos. Tudo era paz. A gêmea idêntica estava sentado em sua cadeira com os olhos fechados. Graças a Deus, pensou naquele momento, de qualquer modo, Laura tinha se lançado em seu jogo tolo, inofensivo. As férias poderiam se transformar na cura que ela precisava, apagando, ainda que temporariamente, o desespero entorpecido que a tinha tomado desde a morte da filha.

"Ela vai superar isso" dissera o médico. "Todos superam com o tempo. E você tem o menino”.
“Eu sei, mas a menina era tudo. Ela sempre, desde o início fora especial, não sei por quê. Acho que era a diferença de idade. Um menino em idade escolar é complicado mesmo, não é um bebê de cinco. Laura literalmente a adorava. Johnnie e eu ficávamos para trás."
“Dê-lhe tempo" repetia o médico, “dê-lhe tempo. De qualquer maneira, vocês são jovens ainda. Haverão outros. Outra filha”.




Tão fácil falar... Como substituir a vida de uma criança amada com um sonho? Ele conhecia muito bem Laura. Outra criança, outra menina, teria suas próprias qualidades, uma identidade separada, podendo até induzir hostilidade por conta deste fato. Um usurpador do berço, o berço que havia sido de Christine.

Olhou por sobre sua taça de vinho, e a mulher estava olhando para ele novamente. Não era casual, à espera da volta de sua companheira, mas algo mais profundo, com intenção, os proeminentes olhos azuis estranhamente penetrantes, dando-lhe uma súbita sensação de desconforto. Dane-se! Tudo bem, pode olhar fixo, se for preciso. Dois podem jogar esse jogo.


Soltou uma nuvem de fumaça do cigarro no ar e sorriu para ela, ofensivamente. Ela não reagiu. Os olhos azulados continuaram nele, de modo que foi obrigado a desviar o olhar, apagar o cigarro, olhar por cima do ombro para o garçom e pedir a conta. Fez algumas observações casuais sobre a excelência da refeição, mas uma sensação de picadas no couro cabeludo permanecera, e uma estranha sensação de mal-estar.

Em seguida, tão abruptamente como tinha começado, viu que seus olhos estavam fechados novamente, ela estava dormindo, ou cochilando, como tinha feito antes.

O garçom desapareceu. Tudo estava quieto.

Olhando para o relógio, pensou que Laura já estava ausente tempo demais. Dez minutos pelo menos.

 
Algo que poderia usar, de qualquer maneira. Começou a planejar a forma que a piada tomaria. Como a velhinha tinha despojado de suas roupas íntimas, sugerindo que Laura fizesse o mesmo. E, em seguida, o gerente tinha surpreendido-as, exclamando em horror, a reputação manchada do seu restaurante, a ameaça de que consequências desagradáveis poderiam vir a menos que...

Toda a fantasia transformando-se em chantagem. Ele e Laura e as gêmeas em uma lancha da polícia de volta para Veneza para interrogatório. Quinze minutos... Oh, vamos lá, vamos lá...

Houve um som e a gêmea caminhou lentamente sozinha, para a mesa dela e ficou ali por um momento, sua figura alta, angular interpondo-se entre John e sua irmã. Ela estava dizendo alguma coisa, mas ele não conseguia entender as palavras. Qual era o sotaque? Escocês? Em seguida, ela se curvou, oferecendo um braço para a gêmea sentada e se afastaram pelo jardim pouco além, a gêmea que tinha olhado para John apoiada no braço de sua irmã. Outra diferença. Ela não era tão alta, e inclinava-se mais, talvez tivesse artríte. Desapareceram de vista, e John tornando-se impaciente, levantou-se e estava prestes a caminhar de volta para o hotel quando Laura surgiu.

— Bem, devo dizer, você me deixou... — começou a dizer, e então parou, por causa da expressão no rosto dela. — Qual é o problema, o que aconteceu?



Podia dizer sem qualquer chance de estar enganado que algo havia de errado. Quase como se ela estivesse em estado de choque. Tropeçou em direção à mesa que ele tinha acabado de desocupar e sentou-se. Ele puxou uma cadeira ao seu lado, segurando sua mão.

— Querida, o que foi? Fale-me, está se sentindo mal?

Ela balançou a cabeça, em seguida, virou-se e olhou para ele. A expressão atordoada que ele tinha notado a princípio tinha dado lugar a uma expressão quase de exaltação.

— Foi maravilhosa — disse ela lentamente — a coisa mais maravilhosa que poderia acontecer. Ela não está morta, ela ainda está conosco. É por isso que olhavam para nós, essas duas irmãs. Elas podiam ver Christine.

Oh Deus, pensou. Era isso que temia. Ela perdera o juizo! O que faço? Como vou lidar com isso?

— Laura, querida — começou com um sorriso – vamos agora? Paguei a conta, podemos ir olhar a catedral e passear em Veneza.

Ela não estava ouvindo, ou pelo menos as palavras não a penetravam.

— John, amor — ela disse. — Tenho que lhe contar o que aconteceu. Eu a segui, como tínhamos planejado, para o toalete. Estava penteando o cabelo e eu fui para o banheiro, e, em seguida, sai e lavei as mãos na pia. Ela estava lavando as dela e de repente, ela virou-se e me disse com um forte sotaque escocês, “Não fique triste. Minha irmã tem visto sua menina. Ela estava sentada entre você e seu marido, rindo”. Pensei que ia desmaiar. E quase desmaiei. Por sorte, havia uma cadeira e me sentei, e a mulher se inclinou sobre mim e acariciou minha cabeça. Eu não tenho certeza de suas palavras exatas, mas ela disse algo sobre o momento da verdade, mas não devia ter medo, tudo estava bem, a visão da irmã havia sido tão forte que elas sabiam que Christine queria que eu soubesse. Oh,  John, juro que não estou inventando, foi o que ela me disse, é tudo verdade.


A urgência desesperada em sua voz fez seu coração encolher. Tinha que jogar o jogo dela, acalmá-la, fazer qualquer coisa para trazer de volta aquela sensação de calma.

— Laura, querida, claro que acredito em você, só que é uma espécie de choque, eu estou chateado porque você está chateada...

— Mas eu não estou chateada — ela interrompeu. — Estou feliz, tão feliz que não posso pôr o sentimento em palavras. Você sabe como tem sido todas essas semanas, em casa e em todos os lugares nós estivemos de férias, embora eu tente esconder isso de você. Agora estou bem, sei que a mulher estava certa. Oh Deus, esqueci o nome dela. Ela é médica aposentada, vivem em Edimburgo, e aquela que viu Christine ficou cega há alguns anos atrás. Embora ela tenha estudado ocultismo por toda vida, só após ficar cega ela realmente passou a ver coisas, como um médium. Elas tiveram experiências maravilhosas, mas descrever Christine como a cega fez para sua irmã, o pequeno vestido azul-e-branco que ela usava em sua festa de aniversário, e ela estava sorrindo alegremente... Oh, isso me fez tão feliz que acho que vou chorar.

Sem histeria, pegou um lenço da bolsa e assuou o nariz, sorrindo para ele. — Estou bem, você vê, não precisa se preocupar. Nenhum de nós precisa se preocupar com mais nada. Dê-me um cigarro.
Ele puxou um do seu maço e acendeu para ela. Ela parecia normal, a mesma, novamente. Não estava tremendo. E se isso a fizesse feliz, por que não? Mas... Mas... Ele desejava que não tivesse acontecido. Havia algo estranho sobre leitura de pensamento, sobre telepatia. Os cientistas não podiam explicar, ninguém podia, e isso é o que deveria ter ocorrido entre Laura e as irmãs. Aquela que tinha ficado olhando para ele era cega. A explicação do olhar fixo. Que de certa forma era desagradável, assustador. Oh inferno, pensou, eu gostaria que não tivéssemos vindo aqui para o almoço. Entre vir aqui e ir até Pádua, tivemos que escolher Torcello.

Perguntou tentando soar casual: — Você não combinou de encontrá-las novamente ou qualquer coisa assim, não é?

— Não, querido, por que eu deveria? Quero dizer, não havia mais nada que pudesse me dizer. A irmã teve sua visão maravilhosa, e só. De qualquer forma, elas estão de partida, é um pouco parecido com a nossa brincadeira de antes. Elas estão viajando ao redor do mundo antes de retornar para a Escócia. Eu disse Austrália, não? Qualquer coisa, mas não assassinos ou ladrões de jóias.

Ela havia se recuperado completamente. Levantou-se e olhou em volta. –Vamos! Já que estamos em Torcello temos que ver a catedral!


Tomaram o caminho a partir do restaurante para o outro lado da praça aberta, com suas barracas de lenços, bijuterias e cartões postais, e assim até a catedral.

 
Um navio grande tinha acabado de descarregar uma multidão de curiosos, muitos dos quais já haviam encontrado em Santa Maria Assunta. Laura pediu ao marido o guia, e, como sempre tinha sido seu costume em dias mais felizes, começou a vagar lentamente pela catedral, estudando mosaicos, colunas, painéis da esquerda para a direita, enquanto John, menos interessado por causa de sua preocupação com o que tinha acontecido, seguia de perto, mantendo um olho alerta para as irmãs gêmeas. Não havia nenhum sinal delas.

 
Talvez tivessem ido para a igreja de Santa Fosca ali perto. Um encontro repentino seria embaraçoso, além do efeito que poderia ter sobre Laura. Mas os turistas anônimos e barulhentos não podiam prejudicá-la, embora transformassem qualquer apreciação artística praticamente impossível. Ele não conseguia se concentrar na beleza fria do que via, e quando Laura tocou sua manga, apontando para o mosaico da Virgem com o Menino de pé acima do friso dos Apóstolos, acenou com a cabeça em solidariedade, ainda não vendo nada além da face triste da Virgem. Num impulso súbito olhou para trás, por cima das cabeças dos turistas em direção à porta, onde os afrescos dos bem-aventurados e dos condenados recebiam o julgamento.

As gêmeas estavam ali, a cega ainda segurando o braço de sua irmã, seus olhos cegos fixados firmemente nele.

Sentiu-se incapaz de se mover, e uma sensação iminente de desgraça e tragédia, caiu sobre ele. Todo o seu ser cedeu, por assim dizer, em apatia, e pensou: “É o fim, não há escapatória”.  Em seguida as duas irmãs se viraram saindo da catedral e a sensação desapareceu, deixando em seu rastro indignação e raiva crescente. Como se atreviam, velhas tolas, a praticar seus truques mediúnicos sobre eles? Devia ser assim, de forma fraudulenta, insalubre, provavelmente a forma como elas viviam em turnê pelo mundo, fazendo com que todos se sentissem desconfortáveis. Se lhes desse chance, colocariam as mãos no dinheiro de Laura.


Sentiu-a puxando-o pela manga novamente.

— Não é linda? Tão feliz, tão serena..
.
— Quem? O quê?

— A Madonna. Ela tem uma qualidade mágica. Não sente isso também?

— Suponho que sim. Não sei. Há muita gente ao redor.

Ela olhou para ele, surpresa.

— O que isso tem a ver? Você é engraçado. Tudo bem, vamos para longe deles. Eu quero comprar alguns cartões postais mesmo.

Desapontada com sua falta de interesse, ela começou a avançar através da multidão de turistas até a porta.

— Vamos — disse ele abruptamente, já do lado de fora. — Temos tempo o suficiente para cartões
postais, vamos explorar um pouco – e afastou-se no caminho que os levariam de volta para o centro, para as casas pequenas, as barracas e a multidão à deriva, escolhendo uma passagem estreita no qual ele podia ver além, um trecho de um canal. A visão de água límpida era um contraste agradável ao sol forte sobre suas cabeças.

— Não acho que isso leva para algum lugar — disse Laura. — É enlameado também, não se pode sentar. Além disso, há mais coisas que o guia de viagem diz que devemos ver.

— Esqueça o livro — disse ele impaciente, puxando-a para junto dele. Colocou os braços ao redor dela.

— É a hora errada do dia para passeios turísticos. Olhe, tem um rato nadando lá do outro lado.
Ele pegou uma pedra e atirou-a no animal que afundou, não deixando nada senão bolhas na superfície.

— Não — reclamou Laura. — É crueldade!

E então, de repente, colocando a mão em seu joelho falou: — Você acha que Christine está aqui conosco?

Ele não respondeu imediatamente. O que havia para dizer? Seria assim para sempre?

— Espero que sim — respondeu lentamente. — Se você sente que sim.

Se Christine estivesse realmente ali, estaria correndo à margem, sem sapatos, querendo pular na água, com Laura correndo apreensiva atrás dela. “Querida, tome cuidado, volte aqui!”

— A mulher disse que ela estava tão feliz, sentada ao nosso lado, sorrindo.

Seu bom humor se transformara em inquietação.

— Vamos, vamos voltar — disse ela.

Ele a seguiu com o coração apertado. Sabia que ela não queria realmente comprar cartões postais ou ver o que restava para ser visto; ela queria ir atrás das velhotas, não necessariamente para falar, só para estar perto delas.

Quando chegaram a um lugar aberto com barracas, ele notou que a multidão de turistas havia diminuído bastante, apenas alguns retardatários, e as irmãs não estavam entre eles. Deviam ter se juntado aos demais que tinham chegado a Torcello pelo serviço de balsa.

Uma onda de alívio se apoderou dele.

— Olhe, tem vários cartões postais nas barracas — ele disse rapidamente — e alguns lenços de cabeça atraentes. Deixe-me comprar-lhe um lenço de cabeça.



— Querido, eu tenho tantos! — Ela protestou. — Não desperdice suas liras.

— Não é um desperdício. Eu estou a fim de comprar algo. Que tal uma cesta? Você sabe que nunca tem o suficiente. Ou alguma renda? Quer?

Ela riu ao ser arrastada para a barraca. Ele diante das quinquilharias espalhadas tentou conversar com a vendedora sorridente. Sua tentativa de comunicar-se em italiano ruim fazendo-a sorrir mais.
Ele sabia que se desse tempo aos turistas para caminhar até o cais e pegar o serviço de balsa, as irmãs gêmeas estariam de vez fora da vista e de sua vida.

— Nunca vi — disse Laura, cerca de vinte minutos mais tarde — tanto lixo empilhado em tão pequeno espaço!

Sua risada borbulhante assegurava que estava tudo bem, que ele não precisava se preocupar mais, aquele momento ruim tinha passado.

A lancha que os havia trazido de Veneza estava esperando. Os passageiros que tinham chegado com eles, os norte-americanos, o homem com o monóculo, já estavam reunidos lá em fila. Mais cedo, antes de sairem, ele pensara que o preço do almoço e do transporte de ida e volta, era decididamente exagerado. Agora não se ressentia disso, exceto que a saída para Torcello tinha sido um dos principais erros desta viagem por Veneza.

Desceram para a popa para procurar um lugar ao ar livre. O barco chacoalhava bastante ao sairem da lagoa para o canal. O Ferry, mais popular e acessível, tinha partido pouco antes em direção de Murano, enquanto eles seguiriam por San Francesco del Deserto e voltando a Veneza.

Ele colocou seu braço ao redor dela mais uma vez, mantendo-a perto, e desta vez ela respondeu sorrindo, com a cabeça em seu ombro.

— Foi um dia lindo — disse ela. — Eu nunca esquecerei, nunca. Sabe querido, agora, finalmente posso começar a desfrutar das nossas férias.

Ele queria gritar de alívio. Vai dar tudo certo, deixe-a acreditar no que quiser, não importa, tanto que a faça feliz. A bela Veneza diante deles, nitidamente delineada contra o céu, e ainda havia muito para ver, vagando juntos, poderia ser perfeito por causa de sua mudança de humor. Começaram a discutir sobre a noite por vir, onde eles iriam jantar, não aquele restaurante que normalmente iam, perto do teatro Fenice, mas em algum lugar diferente, um lugar novo.

— Sim, mas precisa ser barato — disse ela — porque já gastamos muito hoje.



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